Como a Neomed otimizou o tempo de laudo de exames médicos de sete dias para 24 horas, com ajuda de inteligência artificial
Sete dias úteis é o tempo mínimo que um paciente, geralmente, espera para receber o laudo de um exame de método gráfico, como um eletrocardiograma ou um eletroencefalograma. A Neomed é uma startup que surgiu para reduzir o tempo entre os sintomas desse paciente e o tratamento correto para seu diagnóstico. Fundada em 2017, a empresa conecta clínicas e hospitais do Brasil a médicos das mais diversas localidades para fazerem laudos de exames, funcionando como uma espécie de marketplace de laudos médicos.
O administrador de empresas Bruno Farias, cofundador e Chefe de Produto na Neomed, já tinha um pé no empreendedorismo quando conheceu o sócio Gustavo Kuster, durante um curso de empreendedorismo e inovação em Stanford, no mesmo ano em que a Neomed surgiu.
“Nossa primeira ideia foi criar uma forma de pré laudar um exame de holter por de meio de inteligência artificial, mas ninguém quis comprá-la”. Isso não desanimou os sócios, que chegaram em uma outra solução: “Pensamos, então, em oferecer ao mercado de saúde algo mais abrangente”, explica Bruno.
Com o propósito de unir tecnologia e saúde, facilitando a integração entre médicos e clínicas de todos os lugares, Bruno abandonou seu emprego, em 2018, para se dedicar integralmente ao desenvolvimento da startup. Nesse mesmo ano, a Neomed conseguiu captar uma grande rodada de investimento e trouxe o terceiro co-fundador, Luigi Pizzichemi. Em 2019 teve seu maior crescimento: a partir de novos processos de vendas, conquistaram os principais laboratórios do Brasil como clientes e, assim, expandiram sua equipe de seis para 30 funcionários em apenas 12 meses.
Assim como o produto da startup, que abre portas para médicos trabalharem remotamente, a própria equipe de desenvolvedores já estava espalhada por diversos cantos do Brasil, do Rio Grande do Sul a Goiás, e até um colaborador alocado em Portugal. Essa dinâmica de equipe remota não foi um problema na adaptação da empresa ao distanciamento social imposto pela COVID-19, visto que já trabalhavam dessa forma antes mesmo da pandemia.
Google for Startups Accelerator
Depois de três anos de diversas evoluções em seu produto, a Neomed ainda tinha um sonho: ter uma integração de inteligência artificial na sua plataforma. Foi com essa motivação que eles entraram na quinta turma do Google for Startups Accelerator, que aconteceu entre março e junho de 2020. Bruno Farias conta como foi o processo:
Durante o programa, conforme foram entendendo as possibilidades do Cloud Functions por meio das mentorias, conseguiram enxergar outras ferramentas que os ajudaram a criar um dataset (conjunto de dados tabulados). Nas semanas seguintes, construíram um modelo para treinar esse conjunto a transformar as ondas de um exame de eletro em dados. Também implementaram um algoritmo por meio de serverless computing – sem precisar de um servidor operando na infraestrutura. “Foi o nosso momento eureka! A partir disso, conseguimos criar e treinar esse algoritmo de inteligência artificial que avalia a gravidade de um exame de eletrocardiograma, facilitando o trabalho do médico. Foi um dos pontos mais expressivos da mentoria”, comenta Diego Voltz, CTO da startup.
Para a Neomed, o programa de aceleração resultou em um aumento exponencial da produtividade. “Os nossos deploys (processo de implantação de software, que conta com diversas etapas até a sua produção), que antes eram a cada uma ou duas semanas, passaram a ser diários e com zero downtime. Isso significa que a plataforma não precisa ficar inativa enquanto trabalhamos em novas funções e melhorias”, explica o CTO.
“Hoje estamos com a nossa aplicação de IA pronta para rodar na plataforma e otimizar todo o processo de laudo de exames médicos. E o melhor: conseguimos fazer isso sem precisar contratar novas pessoas e aumentar nossos custos”, complementa Bruno Farias.
A importância das mentorias
Durante o programa, a Neomed teve a oportunidade de trabalhar com mentores como Gabriel Moreira, cientista de dados certificado pelo GDE – Google Developers Experts Program. “Em nossas sessões de mentoria, o time da Neomed priorizou o desafio de automatizar a análise de exames médicos. Baseado em um pequeno dataset anonimizado, fizemos uma sessão “mão-na-massa” para automatizar a análise dos exames, prototipando um modelo de classificação de patologias por meio da implementação de modelos de Machine Learning, mais especificamente de um tipo de Rede Neural Recorrente (LSTM) utilizando Tensorflow 2.0, o que ajudou a startup a desmistificar esse tipo de execução”, explica Gabriel sobre o trabalho em conjunto com a startup.
Com as ferramentas discutidas durante a mentoria, a Neomed pode testar, rapidamente, as inúmeras possibilidades para desenvolver o seu produto de IA e entender o melhor caminho a seguir, explica Bruno.
Além disso, também participaram de uma mentoria baseada em segurança junto com Guilherme Leite, desenvolvedor de software e engenheiro de segurança da informação. “A Neomed, por atuar no ramo de saúde, precisa obedecer diversas normas e certificações. Para estarem nessas condições, é necessária não só a criação de processos de controle internos mais sólidos e formalizados, mas também a implementação de controles técnicos, monitorias e funcionalidades que ajudem a melhorar a segurança dos dados e aplicações. Na mentoria, focamos o tempo todo no lado técnico da segurança de cloud dos sistemas deles”, explica Guilherme.
De acordo com o mentor, a Neomed passou por uma migração de infraestrutura há pouco tempo e, desde então, não havia implementado os recursos de segurança dessa nova plataforma de maneira adequada. O maior desafio nesse processo foi tentar encontrar um 'ponto de partida', considerando que a empresa possui uma aplicação com uma boa quantidade de informações, uma infraestrutura relativamente grande, e existia uma enorme gama de soluções e melhorias que poderiam ser implementadas.
“Criamos um retrato de potenciais problemas na plataforma por meio de ferramentas dentro do próprio GCP (Google Cloud Platform), que auxiliaram na análise dos ativos (servidores, conteúdo estático, regras de firewall). O relatório gerado a partir disso pode ser utilizado para nortear os esforços frente às muitas melhorias que a área de segurança sempre exige,” complementou o mentor.
Inteligência Artificial na prática
Hoje a Neomed conta com milhares de exames sendo subidos na plataforma, por clínicas e hospitais, em uma escala mensal. “No caso de um eletrocardiograma, por exemplo, o médico precisa avaliar as ondas cardíacas para identificar possíveis anomalias e, então, fazer o diagnóstico do paciente”, explica Diego. “A nossa solução de IA já vai fazer essa avaliação prévia, funcionando como uma espécie de triagem para auxiliar o médico no veredito”.
Com essa integração de IA na plataforma, a Neomed consegue otimizar todo o processo de laudo de um exame. “Se um clínico geral receber um exame de holter, já vai conseguir entender, com essa pré avaliação, se o paciente corre algum risco ou não. Essa função ajuda a reduzir as possibilidades de diagnóstico, com o máximo de assertividade possível”, comenta Diego.
Os resultados
“Conseguimos aumentar a eficiência médica em dois terços. Um médico gastaria 60% a mais de tempo laudando um exame fora da Neomed”, disse Bruno. Ele também comenta que o tempo do processamento dos dados despencou 97,5%, e que clínicas e hospitais, que geralmente levavam até sete dias úteis para devolver o resultado de um exame laudado, hoje fazem isso em 24 horas.
Além disso, a Neomed está iniciando suas operações no Chile, com planos de expansão para diversos lugares do mundo nos próximos cinco anos. “Acabamos de fechar contrato com um dos maiores operadores de saúde do Brasil e queremos ser a maior empresa do mundo de tecnologia direcionada à medicina”, comenta o fundador.
Enquanto seguem na sua jornada, os três empreendedores têm dicas para compartilhar com outras startups. “Sempre duvide de si mesmo e das suas ideias, preste atenção ao que o mercado está pedindo. E seja um gestor que está sempre próximo da sua equipe, do seu produto e de seus clientes”, aconselha Bruno.
Diego, como CTO, recomenda que se conheça o máximo possível de tecnologias, mesmo que de forma superficial. “É importante saber os conceitos e funcionalidades, para gerar combinações e soluções. Se você conhecer o máximo possível das tecnologias oferecidas pelo mercado, vai conseguir solucionar seus problemas de forma muito mais eficiente, além de chegar a ideias cada vez mais inovadoras para o seu negócio”, conclui.
Saiba mais sobre o Google for Startups Accelerator